segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Opinião: O Perraultimato (Felizes Viveram Uma Vez – Livro I)

Autor: Filipe Faria
ISBN: 9789722348287
Editora: Editorial Presença (2012)

Sinopse:

As estórias são conhecidas de todos: sapatinhos de cristal, maçãs envenenadas, príncipes encantados e lobos maus; e todos sabem que, no fim, os que mereciam viveram felizes para sempre.
Então porque é que isso não aconteceu? Porque é que o mundo parece virado do avesso? E porque é que toda a gente age como se nada fosse? São essas as perguntas que atormentam Borralheiro, um dos poucos que sentem que algo de profundamente errado se passou, e o único que se predispõe a ir em busca de respostas. Respostas essas que lhe chegam às mãos na forma dos versos crípticos do misterioso Perraultimato, que o lança numa demanda em busca da verdadeira essência das estórias.
Acompanhado por quatro outras figuras do imaginário popular europeu —a imprevisível Capuchinho, o enigmático Aprendiz, a atormentada Vasilisa e o perigoso Burra — Borralheiro embarca numa inesquecível aventura neste primeiro volume da distopia folclórica Felizes Viveram Uma Vez.

Opinião:


Autor que conquistou o reconhecimento através das Crónicas de Allarya, Filipe Faria abraçou um novo e diferente desafio com Felizes Viveram Uma Vez.

O Perraultimato é o livro que inicia a nova série que encontra inspiração nos contos tradicionais. Contudo, as histórias que todos conhecem desde a infância ganham contornos bastante diferentes do habitual e o desejado final feliz revela-se estar distante e difícil de alcançar.

Filipe Faria pegou em cinco personagens destas histórias de tradição oral europeia e conferiu-lhes características distintas. Capuchinho não é a doce menina que foi fazer um recado à avó, mas sim uma jovem que herdou uma maldição e que usa o humor e a sensualidade para alcançar um lugar no mundo. Em vez do guerreiro paciente que é recompensado pelos seus atos bondosos, o Mama-na-Burra desta trama guarda rancor e desconfia de tudo e todos. Borralheiro não é o irmão desprezado que conquista a mãe de uma princesa, mas um jovem inconformado que teima em colocar as tudo no seu devido lugar. Em vez de ver os seus erros corrigidos pelo mestre, Aprendiz percebe que ao desobedecer a uma ordem condenou à morte aquele que lhe podia ter ensinado os mistérios pelos quais anseia. A trágica Vasilisa sente-se presa à maldição que carrega, em vez de aproveitar as novas oportunidade de vida e de alcançar a sua felicidade através do árduo trabalho e humildade. Juntos, os cinco vão se ver envolvidos numa demanda pela felicidade e, para tal, seguem as indicações de um misterioso livro: o Perraultimato.

Este livro é evidentemente uma introdução para uma história maior. Neste volume, o leitor fica a conhecer as personagens, a forma como estas se conheceram e o que motiva a jornada conjunta. Com influências de outros contos, para além dos que foram acima mencionados, a linguagem utilizada é clara, apesar de ter alguns conceitos ou expressões mais antiquadas. O ritmo da narrativa é rápido e fácil de acompanhar, o que torna a leitura rápida.

A grande força da trama prende-se com a reflexão sobre as propriedades da tradição da oralidade, subjacente ao desenrolar da ação. Em certo momento, uma personagem refere-se à sensação de insatisfação de Borralheiro quanto ao desenrolar dos acontecimentos como consequência da repetição da história. Afinal, já a tradição popular afirma que “quem conta um conto acrescenta um ponto”, e tal poderá levar à deturpação total da ideia inicial.

As ilustrações de Pedro Potier conferem um carácter mais completo ao livro, aparecendo uma em casa capítulo. Sem exageros, estão bem conseguidas e realçam alguns dos momentos mais interessantes.

Contudo, e apesar de a conceção do autor ganhar interesse ao longo da narrativa, a verdade é que, atualmente, esta não é uma ideia nova. Os contos populares estão em constante reinvenção, não só na literatura, mas como também no cinema e na televisão, o que poderá colocar em questão a originalidade.

Um livro interessante, mas que deverá ser tido como uma introdução. Fica a curiosidade sobre que novas personagens surgirão e com o que poderá acontecer em futuras publicações na série.

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