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segunda-feira, 24 de agosto de 2020

Opinião: "1974"

 

Título Original: 1974 (2019)
Autor:
Niklas Natt och Dag
Tradutor:
Ana Pinto Mendes e Teresa Katzenstein
ISBN: 
9789897840524
Editora: Suma de Letras (2020)

Sinopse:

1794, Estocolmo. Uma mãe chora a filha brutalmente assassinada na noite de núpcias. Desesperada, sem ninguém que atenda o seu pedido, acaba por bater à porta do vigia com um só braço e que chora amargamente a morte do amigo. No hospital de Danviken, nos arredores da cidade, um jovem nobre é atormentado pelo crime repugnante que cometeu. A investigação de Cardell leva-o de novo ao abismo de Estocolmo e à descoberta de que a cidade está mais perversa e perigosa do que nunca.

Neste novo episódio, o leitor reúne-se com Mickel Cardell e Anna Stina Knapp no seu mundo barulhento e depravado, onde o que fica do esplendor gustaviano está prestes a entrar em colapso. Estocolmo verá os seus dias tornarem-se mais sombrios e o antigo esplendor dará lugar à escuridão escondida nos cantos e recantos da corrupta cidade.

 Opinião:

1974 é a obra de Niklas Natt och Dag que se segue ao sucesso do autor 1973. Publicado pela Suma de Letras, este livro retoma o ambiente negro da Suécia do século XIX e recupera algumas das personagens que mais marcaram o livro que lhe antecedeu. Por isso, sim, trata-se de uma história que remete para o pior da humanidade e que causa um forte impacto.

O autor decidiu dividir a trama por vários momentos, sendo que esta escolha é justificada na conclusão. Numa primeira fase, conhecemos Erik Drei Rosen um jovem nascido numa família abastada que tem de ser afastado da terra-natal devido a uma paixão que não é aceite pela família. Nesta incursão, Erik depara-se com uma realidade dura, cruel e desumana. Vai parar a uma terra que sobrevive do tráfico de mão de obra escrava. Numa outra fase, retomamos algumas personagens que já foram apresentadas em 1973 e conhecemos novas ao mesmo tempo que se investiga um novo assassinato ocorrido em circunstâncias macabras.

As personagens são um ponto muito forte nesta obra. O autor conseguiu criar figuras bastante credíveis e reais, ainda que nem sempre capazes de ganhar o afeto do leitor. É que se, por um lado, temos figuras que despertam a nossa empatia, tais como Mickel Cardell, Emil Winge ou Anna Stina, por outro temos seres que geram o nosso desprezo. Contudo, é neste conjunto que encontramos os elementos essenciais para desenvolver esta trama. 

A história é cativante e agarra desde o primeiro momento. Contudo, enquanto leitora, não consegui evitar a revolta, agonia, tristeza e vergonha em muitos momentos desta narrativa. É que aquilo que Niklas Natt och Dag apresenta é uma realidade que existiu. Quem sabe se ainda não existirá em algum lugar. A vida humano é completamente desvalorizada, a emparia com o outro praticamente inexistente, o uso do outro é feito a um nível repugnante e quem não tem poses ou poder luta pela sobrevivência de forma quase animalesca. No final, é importante refletir sobre o que devemos fazer para não voltarmos a cair numa existência tão degradante. Em como o respeito, sentido de comunidade e compaixão podem fazer toda a diferença.

Niklas Natt och Dag volta a surpreender com 1794. O realismo e o macrabro voltam a dar mãos para a construção de uma história que deixa marcas. A conclusão foi inesperada e deixa o leitor com uma sensação de aperto. Afinal, as ações têm consequências e, muitas das vezes, os inocentes são apanhados em fogo cruzado. Isto aliado ao que de pior podemos fazer aos outros parecem ser as mensagens fundamentais do autor. Quase que como um alerta para sermos melhores e, assim, fugirmos de uma época de escuridão.

 

quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Opinião: A Cor Púrpura

Título Original:
The Color Purple (1982)
Autor: Alice Walker
Tradutor: Tânia Ganho
ISBN:  9789896656805
Editora: Suma de Letras (2019)

Sinopse:

Celie, de 14 anos, escreve cartas a Deus para tentar compreender o que lhe está a acontecer. Órfã de mãe, abusada pelo homem a quem chama “pai”, separada da irmã, Netie, privada dos dois filhos e oferecida em casamento a um homem que a maltrata, considera-se «uma negra, pobre e feia”. Até que conhece Sugar, a amante do marido. Com a ajuda de Sugar, «a mulher mais linda» que ela viu na vida, Celie descobre não só o paradeiro da irmã desaparecida mas também o próprio corpo, o prazer, o amor e, acima de tudo, a sua voz.

Romance epistolar composto pelas cartas que Celie endereça a Deus com uma honestidade brutal e pelos relatos de viagem que Nettie lhe envia de uma missão em África, A Cor Púrpura aborda temas como a violência brutal a que estavam sujeitas as mulheres negras no início do século XX, a relação dos negros com o seu passado de escravatura, e a busca do espiritual num mundo cruel e sem sentido.

Opinião:

A Cor Púrpura é um daqueles livros de quase todos ouvimos falar. Existe até uma adaptação cinematográfica! Eu nunca tinho lido este romance de Alice Walker e sentia que estava em falha. Decidi recentemente culmatar essa falha e posso desde já dizer: que história marcante!

O início da obra é logo um murro no estômago. Depressa percevemos que estamos perante um relato cru da realidade de muitas mulheres que viveram no sul dos EUA numa altura mais conservadora e repressiva (e será que essa época já terminou?). Celia escreve cartas sinceras e até algo ingénuas a Deus, nas quais relata momentos do seu dia, faz confissões, expõe dúvidas, revela medos e desejos. É impossível não sentir empatia por esta mulher ao longo das páginas do livro. As cartas são escritas do jeito que fala, tornando-a genuína, nossa amiga e confidente.

Ao longo da narrativa, assistimos à evolução desta protagonista ao londo de vários anos. Sofremos com as suas dores e injustiças de que é alvo às mãos de uma realidade patriarcal. Sentimos orgulho nas conquistas que vai fazendo e na forma que encontra para se afirmar e empoderar.

Além de ser um relato duro e cru sobre o papel da mulher pobre e negra no sul dos EUA, A Cor Púrpura é também uma lição de força. Uma história que merece todo o reconhecimento que recebeu e que deve continuar a ser transmitida pelas gerações. Tem uma mensagem intemporal de luta pela igualdade, força, resistência e amor. Afinal, é possível encontrar o amor mesmo nas situações mais adversas. Pelos outros, pelo mundo e por nós.


sexta-feira, 5 de julho de 2019

Opinião: 1793

Título Original: 1793 (2017)
Autor: Niklas Natt och Dag
Tradução: Rita Figueiredo
ISBN:  9789896657925
Editora: Suma de Letras (2019)

Sinopse:

1793, Estocolmo. Quatro anos após da tomada da Bastilha e mais de um ano depois da morte de Gustavo III da Suécia, as guerras estrangeiras esvaziaram os tesouros e a nação é governada com mão de ferro pelo senhor do reino. Na esteira do falecimento do velho rei, a confiança transformou-se num bem escasso. A paranóia e as conspirações sussurradas abundam em todos os cantos. Uma promessa de violência estala no ar enquanto os cidadãos comuns se sentem cada vez mais vulneráveis aos caprichos dos que estão no poder.

Quando Mickel Cardell, um ex-soldado aleijado e ex-guarda noturno, encontra um corpo mutilado flutuando no lago malcheiroso da cidade, sente-se compelido a dar ao homem não identificado um enterro condigno. Para Cecil Winge, um brilhante advogado que é também detetive consultor na Polícia de Estocolmo, um corpo sem braços, pernas ou olhos é um enigma formidável e uma última oportunidade de acertar as coisas antes de perder a sua batalha com a morte. Juntos, Winge e Cardell vasculham Estocolmo para descobrir a identidade do corpo, encontrando o lado sórdido da elite da cidade.

1793 retrata a capacidade de se ser cruel em nome da sobrevivência ou da ganância - mas também a capacidade para o amor, a amizade e o desejo de um mundo melhor.

Opinião:

Já há muito tempo que não me deparava com uma leitura que me causasse um impacto tão forte. 1793 é um thriller histórico que nos apresenta uma Estocolmo pouco conhecida e personagens que prometem deixar uma marca no leitor. O aparecimento de um corpo mutilado num rio despoleta a ação e dá-nos a conhecer uma história que se destaca de todas as outras que li até ao momento.

Niklas Natt och Dag, o autor, dividiu a narrativa em vários momentos, sendo que em cada fase da história acompanhamos uma ou mais personagens mais relevantes. Numa primeira fase o leitor é apresentado a Mickel Cardell e Cecil Winge. O primeiro é um guarda que ficou sem um braço numa guerra e que, dentro de uma grande revolta, tenta sobreviver num mundo marcado pela probreza. O segundo é um académico que possui uma mente analítica e coloca a justiça e razão à frente de tudo. Gostei muito destas personagens, especialmente de Winge. Os dois fazem um contraste entre a força bruta e o intelecto, sendo que ambos partilham uma noção de compaixão semelhante e acabam por criar uma ligação forte e, inicialmente, improvável. Uma dupla que funciona bem.

Existem outras fases da obra que remetem para fases anteriores à da ação principal. Aqui, conhecemos outras personagens de relevo e temos acesso a informações cruciais para entender o crime, mas também para melhor entrar nesta sociedade e época. Estes capítulos podem, ao início, parecerem algo deslocados do enredo base, mas a verdade é que acabam por agarrar e revelar-se muitos pertinentes. Esta escolha foi um risco para o autor, mas fez todo o sentido. Mas fica o meu aplauso para a construção de cada uma destas figuras e pela forma como evoluíram ao longo da narrativa.

O desenrolar está bem conseguido, mesmo com a paragem da ação principal para dar espaço a capítulos dedicados a outras personagens e a um outro tempo. A leitura começa com curiosidade, mas com o decorrer das páginas dei por mim cada vez mais curiosa com a história e ansiosa para saber o que vinha a seguir. A forma como este crime foi construído e resolvido faz sentido e faz acreditar que provavelmente poderia ter acontecido. E apesar de ter sido um assassinato muito macabro, devo dizer que aquilo que mais me chocou foi mesmo a apresentação desta sociedade.

O autor focou-se mesmo no que de mais negro podemos encontrar na humanidade para a construção desta história. Percebe-se facilmente que houve uma grande investigação relativa à vida e costumes do século XVIII, sendo tudo apresentado através de uma escrita direta e crua, onde o objetivo era mostrar a realidade, por mais chocante que pudesse parecer. Não foi a pobreza que me perturbou, mas sim o desprezo pelo outro. O autor apresenta esta cidade como uma selva onde os mais poderosos, ricos e oportunistas vencem, sendo que todos os outros são maltratados sem qualquer pingo de compaixão. Existem diferentes cenários que não me saem da cabeça.

Fico impressionada por 1793 ser o livro de estreia de Niklas Natt och Dag. O autor tem um estilo muito próprio, que mistura o realismo com a obscuridade dos temas que mais podem perturbar o leitor. Ao mesmo tempo, apresenta personagens profundas, humanas e empáticas que se encontram numa história cativante e credível. Gostei muito deste livro e fico curiosa para saber que mais poderá vir das mãos deste escritor.

segunda-feira, 1 de julho de 2019

Opinião: A Medida do Homem

Título Original: La misura dell'uomo (2018)
Autor: Marco Malvaldi
Tradução: Marta Pinho
ISBN:  9789896657956
Editora: Suma de Letras (2019)

Sinopse:

Um caderno secreto. Uma morte por explicar. Um génio que, depois de cinco séculos, joga com a nossa inteligência e enche-nos de admiração.

Outubro de 1493. Florença continua de luto pela morte de Lorenzo, o Magnífico. Os navios de Colombo só recentemente chegaram ao Novo Mundo. Enquanto isso, Milão experimenta um renascimento sob a liderança de Ludovico, o Mouro.

Aqueles que vagueiam pelos pátios do Castelo de Milão ou ao longo dos canais Navigli encontram, frequentemente, um estranho homem, vestido com uma longa túnica rosa. Tem uma expressão calma, como alguém que está perdido nos seus próprios pensamentos. O homem, cujo nome é LEONARDO DA VINCI, vive por cima da sua oficina, com a mãe e um rapaz travesso que adora; não come carne, escreve da direita para a esquerda e luta para que os seus empregadores lhe paguem um salário. A sua fama estende-se para além dos Alpes, até à corte francesa de Carlos VIII, cujos enviados receberam uma missão secreta que diz respeito ao próprio Leonardo. Há quem diga que o inventor italiano mantém os seus desenhos mais ousados — incluindo talvez o projeto de um cavaleiro mecânico invencível — num caderno que traz escondido sob as vestes, perto do coração.

Quando um homem é encontrado morto no pátio do castelo, o Mouro pede ajuda a Da Vinci. Embora o cadáver não mostre sinais de violência, a morte é altamente suspeita: rumores de uma praga ou explicações supersticiosas precisam ser refutados rapidamente. Leonardo não está em posição de recusar o pedido do seu mestre para investigar.

Opinião:

Leonardo da Vinci é uma das figuras históricas que mais me intriga. Homem visionário e de muitos talentos, marcou profundamente o conhecimento nas mais diferentes e continua a dar que falar por excentricidades que o colocavam à frente do seu tempo. No ano que se marca os 500 anos da sua morte, a Suma de Letras apresente A Medida do Homem, livro de Marco Malvaldi que recorda esta figura ao mesmo tempo que encaminho o leitor para um thriller divertido e repleto de mistérios.

Logo nas primeiras páginas sente-se que esta é uma narrativa original. É que, apesar de se tratar de coteúdo histórico, o narrador não resiste em brincar com o leitor, integrando elementos atuais de modo a explicar algos dados. Esta opção não só ajuda a uma percepção mais imediata de alguns temas, como ainda incute um tom humorístico de que não esperava e muito me surpreendeu. Este foi um dos meus pontos preferidos.

Uma morte misteriosa é o motor desta narrativa que tem uma forte componente de intriga política. Contudo, parece que tudo demorou algo tempo para finalmente avançar. A apresentação das personagens e introdução a alguns esquemas demoram a ser apresentados, sendo que depois tudo parece mover-se demasiado rápido. Ainda assim, é curioso conhecer a corte milanesa, a forma como se deu a sucessão e algumas artimanhas necessárias para se manter o poder.

O autor conseguiu transmitir bem o poder de Ludovico, sendo sempre possível sentir o seu domínio e influência. Trata-se de um governante astuto e que retrata bem o homem da sua época. Leonardo da Vinci surge como o protegido e é curioso ver o paralelismo feito entre patrono e protegido. O autor não deixou passar ao lado algumas características mais conhecidas do artista, tais como o facto de ser vegetariano ou de não lhe ser conhecido um interesse romântico concreto, e procurou desta forma construir-lhe uma personalidade credível.

Gostava de ter visto a figura de Leonardo da Vinci explorada com maior profundidade. Estava à espera de o ver  mais no centro da narrativa e, apesar de ser uma figura muito importante, foram diversas as ocasiões em que outra personagem roubou o foco. Leonardo manteve-se misterioso, o que não é propriamente negativo, mas ficou um pouco aquém do lhe esperava dele. Tinha expectativas de que ele tivesse maior protagonismo.

O desenrolar da narrativa dá a entender que houve pesquisa histórica e preocupação em explicar ao leitor certos momentos e conceitos. Ainda assim, por vezes tive alguma dificuldade em sentir-me presa à leitura, talvez por não haver concretamente um ponto forte que fizesse tudo à volta mover. O aparecimento do corpo poderia ter essa função para a trama, mas acabava por ser um tema algo esquecido em detrimento de outros aspetos.

A Medida do Homem é um livro que proporciona bons momentos, apesar de alguns pontos menos fortes. Marco Malvaldi prova ser um escritor original, com um sentido de humor muito peculiar e com um grande interesse por esta época histórica em concreto. Ainda que não tenha concretizado o desejo de conhecer um outro lado de Leonardo da Vinci, tenho a certeza que aprendi novos aspectos sobre esta época.

terça-feira, 28 de maio de 2019

Opinião: Acredita em Mim

Título Original: Believe Me (2018)
Autor: JP Delaney
Tradução: Ester Cortegano
ISBN: 9789896657901
Editora: Suma de Letras (2019)

Sinopse:

Claire Wright gosta de se pôr na pele de outras pessoas. Mas quem é o isco… e quem é a presa? Claire é uma inglesa estudante de teatro em Nova Iorque. Sem o green card, não tem outra saída senão aceitar o único emprego que consegue: trabalhar para uma firma de advogados especializados em casos de divórcio.

A sua missão é fingir que é uma rapariga fácil, em bares de hotel, para desmascarar maridos infiéis. Quando um dos seus alvos se transforma no objecto de uma investigação por assassinato, a Polícia pede a Claire que use todas as suas habilidades para ajudar a atrair o suspeito para uma confissão.

Opinião:

Este é o segundo livro que li de JP Delaney. Já tinha ficado impressionada com A Rapariga de Antes, por isso as expectativas para este Acredita em Mim estavam altas. Começar a ler um livro já há espera de uma grande história pode ser frustrante, pois estamos mais sensíveis para as fraquezas da trama. Felizmente, as minhas expectativas foram superadas e posso desde já dizer que fiquei mais cativada a esta história do que a primeira que li do autor. Acredita em Mim tem dois pontos muito fortes: as personagens bem construídas e o enredo complexo.

O leitor pode não simpatizar com a protagonista nem aceitar bem as suas escolhas, mas uma coisa é certa: Claire não deixa ninguém indiferente. Vamos descobrindo as várias camadas de personalidade desta figura ao longo da trama. É ainda impressionante que, com o decorrer da história, apareçam muitas dúvidas quanto ao que é real sobre Claire e ao que é pura criação da sua mente. Afinal, ela é apresentada como uma atriz que se entrega por completo aos papéis que representa, muitas vezes tendo dificuldade em distinguir a linha que separa a sua pessoa daquela que está a representar. Perceber quem é a verdadeira Claire é um exercício curioso.

Logo ao início entendemos que Claire é alguém que faz tudo para atingir os seus objetivos, alguém que é carente de afetos e precisa de reconhecimento e atenção. Estes seus traços de personalidade levam-na a uma situação em que tem de ajudar a polícia. A sua missão é tentar perceber se o suspeito de um crime é ou não o responsável pela morte da mulher. Esta premissa parece algo simples, mas com o passar das páginas torna-se cada vez mais intrigante e complexa. É que chagamos a um ponto em que já nem nós sabemos o que é missão e o que é real.

A trama é sempre acompanhada do ponto de vista de Claire e pode ser dividida em vários momentos distintos. Em cada um deles, vemos um novo traço da personalidade desta protagonista e somos levados a pensar sobre quem ela realmente é, quem foi na verdade o autor do crime, para onde tudo se está a encaminhar. Existem diversas reviravoltas inesperadas, e confesso que não estava à espera da conclusão desta obra. Ainda assim, fiquei muito satisfeita com a forma como tudo culminou. Faz sentido.

Existem detalhes maravilhosos nas escrita. Sendo Claire uma atriz apaixonada e dedicada, são vários os episódios que ela relata através do esquema de um guião. Esta incorporação ao longo da história contribui para um ritmo rápido da leitura e aumenta no leitor a ideia da dedicação da protagonista à representação. Uma ideia bem pensada e conseguida com sucesso. A inclusão de temas de Charles Baudelaire também acentua a parte artística e ajuda na construção do criminoso e da sua mente.

Acredita em Mim é um livro que agarra desde a primeira página. A história está muito bem conseguida e as personagens apresentadas fazem-nos acreditar que as pessoas não são aquilo que aparentam e que realmente não se deve confiar totalmente em ninguém. Uma conclusão irónica, tendo em conta o título. Uma leitura imperdível para todos os que gostam de um bom thriller psicológico e de uma história que está sempre a surpreender.

domingo, 28 de abril de 2019

Opinião: Uma Gaiola de Ouro

Título Original: En bur av guld (2019)
Autor: Camilla Läckberg  
Tradução: Elin Baginha
ISBN: 9789896657420
Editora: Suma de Letras (2019)

Sinopse:

Aparentemente, Faye parece ter tudo. Um marido perfeito, uma filha que muito ama e um apartamento de luxo na melhor zona de Estocolmo. No entanto, algumas memórias sombrias da sua infância em Fjällbacka assombram-na e ela sente-se cada vez mais como se estivesse presa numa gaiola de ouro. Antes de desistir de tudo pelo marido, Jack, era uma mulher forte e ambiciosa. Quando ele a engana, o mundo de Faye desmorona-se e ela tudo perde, ficando completamente devastada. É então que decide retaliar e levar a cabo uma cruel vingança…

"Uma Gaiola de Ouro" é um romance destemido sobre uma mulher que foi usada e traída, até tomar conta do próprio destino. Uma história dramática sobre fraude, redenção e vingança.

Opinião:

Este foi um dos livros mais cativantes e envolventes que li nos últimos tempos.  Uma Gaiola de Ouro é um thriller psicológico que, mais do que contar uma boa história, parece procurar chamar a atenção para as fragilidades e forças femininas. É um grito feminista. Através da história de Faye, Camilla Läckberg deixa o leitor agarrado a este livro até à última página. É difícil parar de ler.

Desde a primeira página que me senti cativada com esta leitura. As páginas iniciais dão-nos uma visão terrível do futuro, sendo que logo a seguir começamos a narrativa no tempo da história. É aí que conhecemos a protagonista. Faye é uma mulher da classe alta que é completamente devota à família, mais concretamente ao marido, mas que se anula perante as suas fragilidades. Os seus pensamentos e ações são sempre voltados para o que poderá agradar Jack, o homem com quem se casou. Em contraste, o leitor percebe que o marido é negligente e que já perdeu o interesse em Faye. Logo aqui surge uma forte empatia por esta mulher que deseja ser amada e valoriza.

Mas Faye não se resume às suas inseguranças e à abnegação. Ao longo da leitura, percebemos que se trata de uma mulher de grande inteligência, mas que se colocou sempre em segundo plano em detrimento dos outros. Anos de cedências e de pressão psicológica acabaram por a quebrar e toldar o próprio discernimento, levando-a a um ponto de pura fragilidade. Aquilo que o leitor já adivinhava acontece e é aí que assistimos à queda e reerguer de Faye. Ela renasce das próprias cinzas com um objetivo em mente: vingança. É aqui que entramos na segunda parte desta obra.

Ao longo da narrativa, a autora vai-nos apresentando a outras figuras femininas que representam mulheres que também tiveram que lutar pela sua identidade, voz e felicidade. Estas personagens reforçam muitas das ideias gerais da obra e fazem o leitor pensar na coragem necessária para se lutar por uma vida mais plena. Destaco Chris, cuja irreverência e independência não impedem um lado mais romântico e sonhadora, e Kerstin, que é dona de uma vida de sofrimento e angústia mas que conseguiu encontrar o seu caminho.

O enredo está construído de forma a ser difícil parar de ler. A história em si é interessante e tem uma série de reviravoltas que estimulam a leitura. Quero ainda salientar o facto de a autora levar o leitor a ter sempre dúvidas quanto ao verdadeiro fundo da protagonista. Afinal, Faye tem um passado obscuro, o que nos deixa sempre a pensar sobre até que ponto ela é capaz de ir para atingir os seus objetivos. No final, temos a certeza que ela é uma mulher de quem não gostaríamos de ser inimigos.

Uma Gaiola de Ouro é o thriller do momento. Com uma história forte e personagens que nos parecem reais, faz o leitor ficar agarrado a cada página na expectativa de saber o que vem a seguir. Faye não será facilmente esquecida, disso vos garanto. Um livro que recomendo.


 

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

Opinião: O Homem das Castanhas

Título Original: Kastanjemanden (2018)
Autor: Soren Sveistrup
Tradução: Rita Figueiredo
ISBN: 9789896657390
Editora: Suma de Letras (2018)

Sinopse:

Uma tempestuosa manhã de Outubro. Num tranquilo subúrbio de Copenhaga, a Polícia faz uma descoberta terrível. No recreio de um colégio, uma jovem é encontrada brutalmente assassinada, e falta-lhe uma das mãos. Pendurado por cima dela, um pequeno boneco feito com castanhas.

A jovem e ambiciosa detective Naia Thulin é designada para desvendar o caso. Com o seu colega Mark Hess, um investigador que acabou de ser expulso da Europol, descobre uma misteriosa prova sobre «o homem das castanhas», nome com que os media baptizaram o assassino.

Existem evidências que o ligam a uma menina que desapareceu um ano antes e foi dada como morta: a filha da ministra Rosa Hartung. Mas o homem que confessou o assassínio da menina, um jovem que sofre de uma doença mental, já está atrás das grades e o caso há muito encerrado.

Quando uma segunda mulher é encontrada morta e, junto dela, mais um boneco de castanhas,

Thulin e Hess suspeitam de que possa haver uma ligação entre o caso Hartung e as mulheres assassinadas. Mas qual…? Thulin e Hess entram numa corrida contra o tempo. O assassino tem uma missão… e está longe de a terminar.

Opinião:

Numa época em que os thrillers estão entre os livros mais procurados, por vezes torna-se complicado escolher um que ainda consiga surpreender e marcar pela diferença. Quando comecei a ler O Homem das Castanhas, estava curiosa com o que esta obra poderia trazer de novo ao género. Apesar de alguns pontos que podem ser encontrados noutras histórias deste estilo, uma coisa vos garanto: este é um livro que marca pela intensidade, personagens cativantes, reviravoltas e dificuldade em desvendar o grande mistério da narrativa.

Thulin e Hess são os dois agentes de forças policiais que acompanhamos na resolução de um crime. São duas figuras diferentes, que têm em comum o facto de estarem desiludidas com a situação profissional atual. Ainda assim, as suas mentes são desafiadas por este mistério e, apesar de tudo, eles empenham-se ao máximo para o resolver. É curioso que, ao início, sentia-me cativada com a independência feminina de Thulin, mas no final estava rendida ao misterioso Hess. Estas duas figuras são a prova de que as primeiras impressões podem trazer conclusões erradas e que as pessoas são muito mais do que aquilo que aparentam e do que os rumores que correm sobre elas.

 A construção deste enredo está incrível. Ao início, Soren Sveistrup parece estar a contar diferentes histórias dentro do mesmo livro, sem que nada faça adivinhar em como elas se tocam. Contudo, com o avançar da leitura, torna-se impressionante constatar todas as ligações que existem, ficando provando que esta é uma narrativa que foi bem pensada. O leitor fica sempre intrigado com o que está a acontecer e quer continuar a ler para saber o que vem a seguir, na ânsia de perceber o cruzamento entre os diferentes dados disponibilizados. No final, é impossível não ficar impressionado com a mestria do autor em ligar tudo de forma tão natural e credível.

Os crimes em questão são descritos de uma forma que choca o leitor. Não estamos lá a ver o que se passou, mas é impossível não sentir arrepios e até aversão com algumas das descrições. Nestes casos, o ponto que sempre mais me intriga é a motivação do assassino ou assassinos. Devo dizer que nesta obra esse factor está muito bem conseguido. Tanto que, ao longo da leitura, somos levados a questionar, por diversas vezes, os limites mais extremos da natureza humana. Custa acreditar que tal maldade e sadismo possa existir, especialmente quando o seu perpetuador acredita piamente na verdade dos seus atos.

Quando estou a ler este tipo de histórias, há algo que é inevitável fazer: tentar a tudo custo adivinhar quem cometeu o crime, como e porquê. Fico orgulhosa quando chego a estas conclusões antes do susposto, mas também fico com a sensação que o autor não se esforçou para esconder estes mistérios. Sobre  O Homem das Castanhas, posso dizer-vos: não estive nem lá perto! Fiquei muito surpreendida com as revelações. O autor teve a excelente capacidade de nos fazer sempre olhar para outro lado enquanto escondia a verdade. No final, tudo é exposto de uma forma que nos deixa impressionados e sem perder a coerência e força da história. Aplaudo esta capacidade.

O Homem das Castanhas revela-se um livro que se destaca dentro do seu género. Com um ambiente negro, personagens reais, uma história bem construída, crimes impressionantes e reviravoltas impressionantes, esta obra tem tudo para agarrar o leitor da primeira à última página. Trata-se do primeiro romance de Soren Sveistrup, guionista de vários sucessos de televisão. Só espero que o autor não fique por aqui nas obras literárias e que os próximas tenham a mesma qualidade desta. Recomendo.


quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Opinião: O Dia em que Perdemos a Cabeça

Título Original: El dia que se perdió la cordura (2017)
Autor: Javier Castillo
Tradução: Jorge Pereirinha Pires
ISBN: 9789896657376
Editora: Suma de Letras (2019)

Sinopse:

Centro de Boston, 24 de Dezembro, um homem caminha nu, trazendo nas mãos a cabeça decapitada de uma jovem mulher.
O Dr. Jenkins, director do centro psiquiátrico da cidade, e Stella Hyden, agente do FBI, vão entrar numa investigação que colocará em risco as suas vidas e a sua concepção de sanidade. Que acontecimentos fortuitos ocorreram na misteriosa Salt Lake City há dezassete anos? E por que estão todos a perder a cabeça agora?

Opinião:

Fico sempre impressionada com a capacidade que alguns autores têm em trocarem as voltas ao leitor ao longo de uma história. Javier Castillo faz isso em O Dia em Que Perdemos a Cabeça. O primeiro capítulo deixa uma ideia quase clara do que poderá ter acontecido. Um homem surge na rua nu, coberto de sangue e a segurar a cabeça de uma mulher. Esta ideia leva-nos a uma série de ideias preconcebidas e que condicionam a nossa percepção do rumo da trama. Mas será esta a linha de pensamento correta?

Este é um thriller que não deixa de surpreender. Apesar das 450 páginas, trata-se de um livro que se lê com rapidez e vontade, tal é a ânsia de desvendar o que vem a seguir neste mistério. Existe sempre algo inesperado no enredo, e as próprias personagens revelam-se de formas diferentes ao longo da leitura. Começamos ao lado do dr. Jenkins e de Stella Hyden na tentativa de perceber quem é aquele homem que surgiu com uma cabeça nas mãos, o que ele fez e os motivos para o fazer. Nada é claro, e, com o passar das páginas, começamos até a duvidar das figuras que tínhamos como centrais e de maior moralidade.

Paralelamente, existem capítulos que relatam acontecimentos de há 17 anos. Ao príncipio pode parecer que estes relatos nada têm a ver com a trama principal, mas com o tempo começamos por perceber as ligações. E estas tornam-se cada vez mais fortes. Acompanhamos a adolescente Amada numas férias de família que começam com sinais estranhos mas macabros. Só com o tempo percebemos como tal está relacionado com a atualidade e com o crime hediondo relato no início da trama. E estas ligações estão muito bem feitas. Algumas acabam por serem fáceis de adivinhar, mas outras nem tanto.

O desenrolar da ação é rápido e impele para uma leitura ritmada e interessada. Os capítulos pequenos e que apresentam sempre pontos de vista diferentes ajudam a manter a vontade de ler e de desvendar os segredos escondidos nesta trama que parece estar a ser contada do início para o fim. As personagens podem carecer de maior estrutura, mas a força da narrativa faz-nos conseguir perdoar isso e levar-nos a concentrar no enredo intrincado.

A conclusão acaba por ser aquela que adivinhamos já perto do final, mas, ainda assim, o autor consegue manter um segredo. Resta saber se tal revelação é suficiente para a criação de um segundo volume ou se tal serve apenas para manter o leitor em suspense e arrebatado já mesmo quando está a fechar o livro. Sinceramente, tinha interesse em saber o que ainda poderia vir por aí, até de forma a conhecer melhor algumas personagens que aqui foram apresentadas.

O Dia em Que Perdemos a Cabeça foi o primeiro livro que li este ano e pode-se dizer que me fez iniciar bem 2019 no que toca a leituras. Não estava à espera das muitas reviravoltas nem da capacidade do autor de me levar sempre a imaginar as possibilidades para a resolução final. Intenso, misterioso, intrigante e viciante. Recomendo a leitura.

quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Opinião: Uma História Negra

Título Original: Una Storia Nera (2017)
Autor: Antonella Lattanzi
Tradução: Simonetta Neto
ISBN: 9789896655495
Editora: Suma de Letras (2018)

Sinopse:

Carla e Vito casaram-se muito novos. Foram o grande amor um do outro, mas o amor de Vito era obsessivo e violento. Assim que os filhos mais velhos saem de casa, Carla consegue divorciar-se e muda-se com Mara, a filha mais nova, para um bairro nos subúrbios. No terceiro aniversário de Mara, cedendo à insistência da filha, Carla convida Vito para o jantar. Depois de muito tempo a família está reunida e a noite corre surpreendentemente bem. Na sequência, Vito desaparece...

Opinião:

Há livros que nos arrepiam. Este é um deles. Não por contar uma história fantasiosa e que tem o objetivo de nos provocar medo, mas sim por ser uma narrativa que poderia ter acontecido. Que acontece, com pessoas diferentes e outros contornos. Esta é uma história de abusos, violência, de submissão, de medo e de amor.

Uma História Negra surge como uma mistura entre romance e thriller. Antonella Lattanzi apresentada um drama familiar impressionante, ao mesmo tempo que coloca o leitor no papel de detective. Afinal, ao início encontramos uma família com história de violência nas suas mais diversas formas, para mais tarde nos depararmos com um crime cuja solução só surge mesmo no final. Os momentos mais agressivos são mesmo chocantes e levam o leitor a pensar no que fariam em tal situação. Não é apenas a violência física que choca, mas muito mais a psicológica, que leva Carla a tornar-se uma pessoa aprisionada.

Fiquei impressionada com as personagens deste livro. Carla não mostra apenas o papel de mulher que é vítima, indo para além disso e revelando ao leitor a força que encontrou para dar à volta pela situação. Ela impressiona pelo que faz pelos filhos, mas também pela mistura de sentimentos que nutre pelo ex-marido agressor. Percebe-se que ali existe repulsa mas também amor, algo que a autora expôs muito bem. Para quem nunca passou por tal situação, é difícil imaginar como estes sentimentos podem existir ao mesmo tempo nestas situações, mas Antonella Lattanzi elucida-nos como ninguém e consegue levar-nos a vestir a pele desta personagem.

Também fiquei muito intrigada com os dois filhos mais velhos de Carla e Vito, Nicola e Rosa. Eles mostram lados diferentes de jovens que nasceram num lar onde existiram abusos contra a figura materna e desenvolveram-se de diferentes formas, ainda que tenham uma grande união. Com o passar das páginas, foi impossível não pensar naquela ideia de que nos tornamos nos nossos pais mais cedo ou mais tarde. É que Nicola e Rosa parecem que, conscientemente, procuram ser diferentes destas pessoas mais, de forma impensada, podem estar a caminhar no sentido contrário que pretendia.

No meio de tudo isto surge um verdadeiro caso de polícia que leva o leitor a procurar respostas. Acompanhamos uma investigação inesperada e um julgamento intenso. Surgem novas figuras que marcam posições diferentes, sendo relevantes mesmo que nem sempre seja fácil simpatizar com elas. As novidades que surgem enquanto o crime é desvendado fazem-nos pensar sobre se vale a pena manter a passividade ou se o melhor será agir. Mas as reviravoltas acontecem e a nossa percepção sobre estes acontecimentos pode mudar.

O ritmo pode não ser linear, alguns momentos podem ser mais parados ou confusos, e a linguagem por vezes poderá ser mais introspectiva do que se desejaria. Ainda assim, tudo somado, ficamos perante uma obra que nos faz pensar, provoca diferentes sensações e nos deixa ansiosos pelas revelações finais. Um livro pertinente e uma história intensa, ainda que muito negra e, infelizmente, real.


quarta-feira, 3 de outubro de 2018

Opinião: O Castigo dos Ignorantes (Sebastian Bergman #5)

Título Original: De Underkanda (2018)
Autor: Hjorth & Rosenfeldt
Tradução: Elin Baginha
ISBN: 9789896655556
Editora: Suma de Letras (2018)

Sinopse:

A estrela de um reality show é encontrada morta numa escola, com um disparo na cabeça. Amarrado a uma cadeira de sala de aula, posicionado de frente para um canto, com orelhas-de-burro. Um exame longo, de várias páginas, pregado na parte de trás da cadeira. A julgar pelo número de respostas erradas, a vítima falhou no teste mais importante da sua vida.

Esta morte será o primeiro de uma série de assassinatos contra várias personalidades dos media e o Departamento de Investigação Criminal é chamado. Lutam para encontrar provas e finalmente Sebastian Bergman descobre pistas em chats e cartas anónimas publicadas em jornais. O autor das cartas opõe-se à falta de educação entre os modelos da nova geração e fala muito sobre os assassinatos. Sebastian desafia-o e fica claro que o seu oponente sem rosto tem informações sobre os assassinatos a que ninguém além da polícia —e do assassino —tem acesso.

Neste novo caso Sebastian Bergman e sua equipa enfrentam um serial killer complexo e tortuoso, que ameaça a própria existência da equipa.

Opinião:

Pegar num novo livro da série "Sebastian Bergman" é sempre um entusiasmo. Há vontade de reencontrar as personagens que já conquistaram e desvendar novos mistérios com a Riksmord. Além disso, surge também a vontade de perceber o que de novo os autores ainda nos podem oferecer. Quais são os desenvolvimentos das figuras desta série? Que novo ou novos crimes podem acontecer de forma a nos deixarem presos às páginas de um livro de Hjorth & Rosenfeldt. Assim que comecei a ler O Castigo dos Ignorantes fiquei com a certeza: ainda há muito por onde explorar!

Começamos esta nova obra logo a conhecer, de certa forma, o criminoso. O primeiro capítulo dá-nos uma percepção do modos operandi de um assassino que tem alvos que correspondem a uma realidade e ideia que o abomina: a exaltação da ignorância. Torna-se fácil perceber o motivo de o livro ser este. O teste que é colocado à vítima é-nos apresentado, assim como o que acontece a quem falha nesta provação. Tudo isto é estimulante, um arranque bem conseguido e que nos leva numa leitura ritmada.

Reencontramos as personagens no drama que atualmente enfrentam. É que todos têm os seus problemas pessoais, distintos e pesados, o que lhes confere maior humanidade e nos leva a perceber que, apesar de muito dedicados ao trabalho, são mais do que simples polícias de investigação. Sebastian continua a ser o protagonista de comportamente deprezível e que mesmo assim nos conquista. Vanja está numa fase de maior dificuldade, em que coloca tudo em causa e começa a repensar sobre o que quer para a sua vida. Ursula lida com a solidão inesperada e procura fazer com que as suas limitações não afetem o seu trabalho nem a aparência que cultiva. Torkel continua a saer assumir-se como lider e parece começar a encontrar um caminho de felicidade. Billy consegue chocar ainda mais com o lado negro que tenta ocultar.

O desenrolar da ação acontece através de um bom encadeamento de acontecimentos. Esta história prende facilmente e é lida com vontade. Não senti aborrecimento em qualquer momento, tal era o desejo de continuar a acompanhar estas personagens como de perceber como iriam chegar ao desfecho escolhido pelos autores. Mais uma vez, fiquei impressionada com a forma como a mente de Sebastian trabalha e o leva no caminho da verdade, mesmo que tal signifique ficar em risco. A oposição de Sebastian com o assassino está muito bem conseguida.

Esta leitura faz-nos pensar sobre o que é a cultura, a inteligência e a ignorância. É que ao longo do desenvolvimento destes crimes, somos levados a perceber que tais conceitos são entendidos de forma diferente pelas personagens. Existe uma clara chamada de atenção para as novas noções de fama, potencializadas por reality shows, blogues ou redes sociais, que muitas vezes surgem graças a conteúdos considerados menores. Contudo, há também uma chamada de atenção para o facto de vivermos num mundo muito diferente de há 20 anos, onde a iniciativa e empreendimento merecem ser louvados e onde a informação e o conhecimento poderá estar à distância de um clique. Tudo depende da vontade e dos interesses de cada um.

Este quinto livro está entre os meus prefereidos da série "Sebastian Bergman". Hjorth e Rosenfeldt deixaram-me novamente rendida pela forma como conseguem interligar o desvendar de crimes com a vida pessoal das personagens. O final é impressionante e deixa adivinhar que vem aí uma grande reviravolta para esta série. E tendo em conta a experiência de quem está a ler a série, tanto pode ser o que imaginamos como algo ainda mais surpreendente. Sim, estou ansiosa pela publicação do sexto volume!


Opiniões a outros livros de Hjorth & Rosenfeldt:
Segredos Obscuros (Sebastian Bergman #1)
O Discípulo (Sebastian Bergman #2)
O Homem Ausente (Sebastian Bergman #3)
A Menina Silenciosa (Sebastian Bergman #4)

domingo, 19 de agosto de 2018

Opinião: O Que Fica Somos Nós

Título Original: The Light We Lost (2017)
Autor: Jill Santopolo
Tradução: João Tordo
ISBN: 9789896655488
Editora: Suma de Letras (2018)

Sinopse:

Numa luminosa manhã de fim de Verão, Lucy e Gabe encontram-se na universidade, em Nova Iorque, e apaixonam-se. Parece o começo de uma história como muitas outras, mas estamos a 11 de Setembro de 2001 e, enquanto a cidade está envolta em poeira e detritos, eles beijam-se e trocam promessas. Assumem que têm de encontrar um significado para as suas vidas, tirar proveito delas, deixar uma marca. Jovens e apaixonados, parecem ter o mundo a seus pés. Inesperadamente, os seus sonhos acabam por os separar. Gabe aceita trabalhar como repórter fotográfico no Médio Oriente e Lucy decide continuar a sua carreira em Nova Iorque.

Treze anos depois, Lucy está numa encruzilhada. Sente a necessidade de revisitar as épocas fundamentais do seu relacionamento com Gabe, marcado por escolhas que os conduziram por diferentes caminhos, ao longo de diferentes vidas. Escolhas que, no entanto, nunca romperam o vínculo profundo que os une. Então, é chegado o momento, naquele dia... Lucy mantém um último segredo, e é hora de o revelar a Gabe.

Todas as suas opções os conduziram até ali. Agora, uma última decidirá o seu futuro.

Opinião:

Em O Que Fica Somos Nós, Jill Santopolo apresenta-nos uma bonito e comovente romance, ao mesmo tempo que nos faz refletir sobre os relacionamentos do século XXI. Nesta obra, Lucy conta-nos a sua história de amor, desde os momentos mais felizes aos que lhe causaram maior sofrimento. Narrado na forma de uma carta, a protagonista faz-nos confidências e mostra-nos o seu lado mais íntimo, o leva o leitor a aproximar-se dela e a sentir uma inevitável empatia.

Conhecemos Lucy durante a faculdade, num dia que marcou a História Contemporânea. A 11 de setembro de 2001, Jill conhece Gabe, aquele que viria a ser o seu grande amor. O primeiro contacto deles fica então associado a um ponto de viragem, sendo que ambos repensam as suas vidas, os seus desejos e o que ambicionam fazer pelo mundo e pelos seus destinos. Apesar de ser fácil perceber que eles estão ligados por fortes sentimentos, seguem-se uma série de encontros e desencontros.

Lucy é uma personagem que não me conquistou imediatamente, mas que conseguiu a minha simpatia com o decorrer da leitura. Inicialmente, achava-a demasiado obcecada com Gabe, ao ponto de se anular em detrimento dele. Isso não me agrada. Contudo, gostei da forma como ela foi construindo o seu percurso , procurando encontrar um equilíbrio entre razão e emoção, mas sem nunca perder de vista a sua verdadeira essência e lutando para ser fiel a si própria, com mais ou menos compromissos.

Gabe demorou mais a convencer-me. Enquanto Lucy estava disposta a tudo para o ter a se lado, Gabe demorou a deixar de ser tão centrado em si próprio. Para esta personagem é o tudo ou nada, demorando a perceber que, para estar com alguém, é preciso saber ceder. Sem isso, os relacionamentos caíram como um castelo de cartas que ele tentava construir. A intenção estava lá, mas faltava-lhe a solidez e o compromisso. Como tal, muitas vezes achei Gabe algo tóxico.

O paralelismo entre a relação que Lucy teve com Gabe daquela que construiu com Darren está muito bem conseguida. Por se tratarem de dois homens diferentes, estas ligações também são distintas, em muitos sentidos. O início, o tipo de amor, o compromisso, a evolução do relacionamento, os desafios, ... tudo isto é dissemelhante. Admito que inicialmente simpatizei com Darren, mas acabei por não apreciar a pessoa que estava escondida atrás da máscara.

 A leitura é feita com interesse, mas sem grande arrebatamento. Gostei de conhecer esta história, e sinto que aborda temas muito importantes sobre a forma como vivemos as relações. Apreciei também a forma como Lucy vai encontrando a sua força, conquistando a coragem necessária para tomar as atitudes que a levarão no caminho que considera mais acertado. Contudo, certos momentos pareceram-me mais melodramáticos do que seria desejado, além de que o final foi algo previsível e que acabou por não marcar particularmente, apesar da reviravolta.

No final desta leitura, é impossível não refletir sobre as escolhas que fomos fazendo ao longo da nossa vida. Jill Santopolo faz-nos ponderar sobre o poder das decisões que tomamos e como estas moldam o nosso caminho. Como tal, está nas nossas mãos lutar pela felicidade e pelos objetivos que traçamos para nós, sendo que nesse trajeto todo o risco vale a pena. O Que Fica Somos Nós é um bom livro para quem não resiste a uma bonita história de amor


quinta-feira, 21 de junho de 2018

Opinião: A Mulher Entre Nós

Título Original: The Wife Between Us (2018)
Autor: Greer Hendricks e Sarah Pekkanen
Tradução: Gonçalo Neves
ISBN: 9789896655471
Editora: Suma de Letras (2018)

Sinopse:

Aos 37 anos, a recém-divorciada Vanessa está no fundo do poço. Deprimida, a morar no apartamento da tia, sem filhos, sem dinheiro e sem amigos verdadeiros. Richard, o seu carismático e rico marido, era tudo para ela. Mas, ao descobrir que ele está prestes a voltar a casar, algo dentro de Vanessa se desfaz. A partir de agora, na sua vida, só existirá uma única obsessão: impedir esse casamento. Custe o que custar.

Nellie é como qualquer outra jovem bela e sonhadora que chega a Manhattan para começar a sua tão sonhada vida adulta. Mas a personalidade tranquila que ostenta é apenas uma fachada. Na sua cabeça perdura o segredo que a faz fugir da sua cidade natal e que a impede de caminhar sozinha para casa.

Ao conhecer Richard - bem-sucedido, protector, o homem dos seus sonhos -, Nellie começa finalmente a sentir-se segura. Ele promete protegê-la de tudo para o resto da sua vida. Mas, de repente, começa a receber chamadas misteriosas. Algumas fotografias são mudadas de lugar no seu quarto. Alguém a persegue, alguém quer o seu mal. Mas quem?

Opinião:

Sabia que A Mulher Entre Nós estava a causar furor a nível internacional, e por isso mesmo não quis perder esta leitura. Ao ter apenas a sinopse como base, fiquei bastante surpreendida com a história que encontrei. Este é um thriller familiar cheio de reviravoltas estimulantes. As ideias estabelecidas inicialmente são abaladas em mais do que uma ocasião fazendo com que seja difícil largar o livro, tal é a vontade de perceber a verdade por trás de tudo o que é narrado.

Confesso desde já que é difícil falar sobre este livro sem fazer alguma revelação que pode prejudicar a experiência de leitura de quem ainda vai apostar nesta obra. Por isso mesmo vou falar deste livro de uma forma mais abrangente. Inicialmente, as autoras apresentam-nos Vanessa, que surge como uma mulher que está a atravessar sérias dificuldades para atravessar o divórcio. A negatividade que Vanessa parece transmitir contrasta com a jovialidade e as esperanças de Nellie, uma jovem que está prestes a casar-se. A diferença entre estas figuras é marcante e proporciona momentos de leitura diferentes. Como tal, é natural haver maior interesse ou ligação com uma destas partes em detrimento da outra.

No meu caso, senti-me intrigada com as preocupações relativas ao passado de Nellie e queria descobrir ao certo que tinha levado Vanessa àquele estado. É curioso perceber que as suposições que tinha sobre as bases destas figuras e o futuro que lhes estava reservado estavam erradas. As autoras conseguem interligar estas duas vertentes de uma forma muito interessante, sendo que o leitor fica a sentir-se constantemente na ponta da navalha e com vontade de não largar o livro.

O desenrolar da trama é cativante. Admito que estranhei a forma como alguma ligações foram feitas, quase como a forçar uma linha de pensamento no leitor e sem grande relação com o que iria ser revelado. Ainda assim, consigo colocar esta questão de lado em detrimento do resultado global da obra. Esta é uma história que, apesar de alguns momentos mais romanceados, pode sugerir que algo semelhante pode ter acontecido ou estar a acontecer entre um casal.

São abordados diferentes temas ao longo destas páginas. A dor da separação, a esperança e vitalidade de uma nova relação, o amor entre familiares, a força e fragilidade de uma amizade, a abnegação que surge com a paixão, a vingança, o sofrimento que fica dos erros do passado. Contudo, o assunto mais forte acaba mesmo por ser a violência doméstica. As duas autora conseguiram apresentar esta tema de uma forma subtil, pouco óbvia, que vai surgindo aos poucos e explorando diferentes vertentes. Aplaudo a forma como retrataram as consequências da violência emocional e psicológica para a vítima, lados menos compreendidos desta agressão e que muitas vezes são difíceis de detectar.

Greer Hendricks e Sarah Pekkanen provam que as pessoas que mostram ser mais fortes muitas vezes estão quebradas, e que as mais frágeis podem estar a esconder um poder. Fiquei muito bem impressionada com A Mulher Entre Nós, um livro que em diferentes momentos conseguiu mudar todo o ponto de vista que tinha estado a criar desde a primeira página. Com personagens profundas e um enredo apelativo, as autoras apresentam-nos uma das melhoras histórias dentro do género.

 

quinta-feira, 17 de maio de 2018

Opinião: A Casa da Beleza

Título Original: La Casa de la Belleza (2015)
Autor: Melba Escobar
Tradução: Paulo Ramos
ISBN: 9789896655501
Editora: Suma de Letras (2018)

Sinopse:

Crescer na terra dos narcos: tornar-se uma mulher na Colômbia de Escobar. Uma perspectiva da sociedade colombiana, a partir de uma lente feminina, onde são abordadas as relações raciais, a corrupção e o problema do género. Karen, esteticista de profissão, muda-se de Cartagena para Bogotá em busca de uma vida melhor, mas ao chegar não só consegue trabalho como depiladora n’A Casa da Beleza, como se converte na chave para resolver o mistério da morte de uma das suas clientes - uma jovem rapariga, vestida com o uniforme da escola, que aparece morta no dia a seguir a ter visitado Karen no salão. Com quem se a encontrar a cliente de Karen? Entre conversas íntimas e confissões, Karen acabará por ser a confidente de uma psicanalista, da mulher dum congressista, de uma famosa apresentadora de televisão e de uma mãe desolada que busca justiça num país onde a verdade só pertence àqueles que podem pagar por ela.

Opinião:

Uma casa de estética e beleza sugere sempre um tempo de descontracção, cuidado com a própria imagem, um momento de mimos que as mulheres dão a si próprias. Certo? Nem por isso. Melba Escobar inspirou-se num destes espaços para explorar o lado mais negro da Colômbia. Assim, A Casa da Beleza impressiona desde o primeiro momento, apresentando-se como um livro que dificilmente deixará alguém indiferente.

Através de algumas clientes que passam por este espaço, ficamos a conhecer Karen. Esta mulher é uma esteticista que acaba por representar um grupo muito vasto daquele país: o das mulheres que procuram uma vida melhor. Mãe solteira, Karen deixou o filho aos cuidados da avó e partiu para Bogotá, na esperança de fazer dinheiro na grande cidade. Ora, tal missão torna-se difícil. É que na capital da Colômbia existe discriminação, aproveitamento e crime. Ao longo destas páginas, vemos Karen a cair numa espiral impressionante que nos leva a analisar toda uma sociedade.

O desenrolar da trama vai acelerando conforme as páginas vão passando. Confesso que, ao início, pode ser um pouco estranho perceber a forma como a narrativa é apresentada. Contudo, apreendida a peculiar linguagem da autora é fácil ficar-se preso neste livro. O crime que faz tudo despoletar não nos larga, sendo que as informações que vão sendo fornecidas chocam devido à violência e ao espelho que fazem da sociedade. Paralelamente, assistimos ao que acontece a Karen e às consequências de tudo isso para a sua vida.

Sendo as personagens centrais femininas, o papel da mulher neste país tem um grande foco ao longo desta obra. É revoltante assistir a certos momentos, não só pelo que acontece mas também pela forma como a sociedade os encara. Nestes casos, uma mulher é sempre vista como inferior, os seus problemas são desvalorizados, tudo o que de terrível lhe acontece é apontado como merecido pelas mais diferentes razões. Somos levados a perceber as desigualdades de género gritantes que existem actualmente, muito devido a questões culturais que estão tão enraizadas que acabam por serem difíceis de serem ultrapassadas. É, portanto, urgente uma mudança de mentalidades, maior e melhor educação da população.

Melba Escobar leva o leitor a perceber as dificuldades vividas por grande parte da população daquele país. A autora consegue expor bem a pobreza e desigualdade social existente ao longo de toda a obra. Saliento o momento em que acontece um casamento de classe alta: os noivos são apresentados como muito religiosos e a cerimónia fica marcada pela ostentação, sendo que ao mesmo tempo os mendigos passam à porta da igreja na esperança de conseguirem a bondade de algum transeunte. As descrições do ambiente vivido nos diferentes bairros, ruas e transportes mantém esta diferença social sempre presente. Corrupção e jogos políticos acabam por serem desvendados de uma forma que causa revolta.

A Casa da Beleza é um livro escrito com perspicácia e inteligência. A autora consegue fazer uma análise social pertinente, arrepiante e incómoda. Tudo isto através de uma história que começa por se apresentar bastante próxima, especialmente do público feminino. É fácil sentir empatia pelas figuras centrais, compreender os seus problemas e perdoar os erros cometidos. Melba Escobar faz um apelo por igualdade e justiça através de uma história que dificilmente será esquecida.


terça-feira, 8 de maio de 2018

Passatempo especial de aniversário: "Boneca de Trapos"

O blogue faz 6 anos e a Suma de Letras juntou-se à festa. Para celebrar, estamos a sortear um exemplar do impressionante thriller Boneca de Trapos, de Daniel Cole.


Para se habilitarem a ganhar este livro, apenas precisam de:

- Responder a todas as questões colocadas no formulário (podem encontrar as respostas aqui);
- Seguir o blogue e/ou fazer gosto na página de Facebook do blogue, aqui;
- Só participar uma vez (caso tal não se confirme a participação será anulada);
 - O passatempo termina no dia 18 de Maio às 23h59. Não serão aceites participações após essa data.

Agora é só participar!





Notas:
- Este passatempo é realizado em parceria com a Suma de Letras;
- O vencedor será escolhido aleatoriamente entre as participações válidas através do site random.org;
- Como participação válida entende-se: existir apenas uma por participante com todos os dados do questionário respondidos correctamente;
- O vencedor será contactado por e-mail e anunciado no blogue;
- Este passatempo é válido para Portugal continental e ilhas;
- O blogue não se responsabiliza pelo possível extravio do livro nos correios.

quarta-feira, 18 de abril de 2018

Opinião: A Última Travessia

Título Original: Fatal Crossing (2015)
Autor: Lone Theils
Tradução: José Remelhe
ISBN: 9789896655464
Editora: Suma de Letras (2018)

Sinopse:

O barco chegou ao destino, duas passageiras... não. Duas jovens dinamarquesas desaparecem, sem deixar rasto, a bordo de um barco com destino a Inglaterra, em 1985. Vários anos depois, a jornalista Nora Sand, que trabalha em Londres para a revista dinamarquesa Globalt, compra uma mala velha numa loja de antiguidades, numa cidade do litoral. Quando a jornalista abre a mala, encontra uma série de fotografias, e uma delas, onde aparecem duas jovens a bordo de um barco, chama-lhe a atenção. Nora lembra-se imediatamente do famoso caso das duas raparigas desaparecidas em 1985, que nunca fora encerrado. Nora Sand não pode deixar de pensar no caso e viaja até à Dinamarca para descobrir o que aconteceu às duas jovens. Rapidamente depara com a história de um assassino em série que está a cumprir pena de prisão perpétua e que parece ter a chave do caso. Mas, para Nora, qual será o preço a pagar?

Opinião:

Um mistério por resolver, um desaparecimento que incomoda e uma jornalista que tropeça no que pode ser uma nova pista. A Última Travessia é um thriller que prende a atenção desde o primeiro momento. Tal acontece devido à trama, que desenvolve a bom ritmo e vai fornecendo novas informações com o passar das páginas, pela protagonista empática e pela vontade de descobrir o que aconteceu a Lisbeth e Lulu, duas jovens que desapareceram sem deixar rasto durante uma viagem de ferryboat.

Nora Sand é a jornalista que, de um momento para o outro, se vê seduzida por este caso antigo que nunca foi resolvido. A nova pista que ela encontra deixa perceber que se trata de uma profissional atenta aos detalhes, meticulosa e capaz de tudo para conseguir as informações que precisa. A par disso, é também possível conhecer o seu lado mais humano, nomeadamente através da relação com os pais e com Andreas, um amigo de outros tempos que se transforma numa paixão pouco conveniente. E de realçar ainda o sentido de humor peculiar desta personagem.

Ao acompanhar a protagonista somos levados por uma aventura cuja intensidade cresce de página para página. Ao início sentimos que estamos a caminhar com cautela, pegando em alguns pedaços de informação novos que vão surgindo, mas a certo ponto percebemos que estamos a pisar terreno perigoso e que poderá colocar até mesmo a vida de Nora em risco. De salientar o momento em que a protagonista se encontra na prisão com um assassino em série e o de que seguida lhe acontece. É possível sentir a tensão a aumentar, o que provoca uma leitura mais rápida.

O desenrolar da acção está bem construído. No início sentimos a ser apresentados à protagonista e ao seu mundo, mas isto é feito de uma forma que capta o nosso interesse. Vê-la a trabalhar mostra-nos como é capaz de conjugar a profissão com as suas emoções e vida pessoal, algo com o qual nem sempre é fácil lidar. É interessante vê-la a envolver-se cada vez mais neste mistério, até ao ponto de tal já a consumir. Nessa fase, também nós nos sentimos absorvidos pela investigação, seduzidos pela busca da verdade e até mesmo pela exploração do lado mais negro da humanidade.

Se existem alguns dados fáceis de prever, outros não são assim tão óbvios. Confesso que não esperava o desfecho que a autora, Lone Theils, deu a esta aventura. Fiquei surpreendida e aplaudo a originalidade, apesar de haver um ou outro ponto que podem ter custado um pouco mais a aceitar. Ainda assim, fica a prova de que este é um thriller original, algo importante numa altura em que existe tanta escolha dentro do género.

Com este livro, Lone Theils apresenta-nos uma protagonista que poderá trazer ainda grandes surpresas no futuro, ao mesmo tempo que descobrimos uma história com consegue cativar com facilidade. A Última Travessia faz-nos recordar um lado mais negro do mundo, muitas vezes ocultado por ilusões ou pela nossa incapacidade de o aceitar. Não é fácil esquecer o passado, especialmente quando contém situações traumáticas, mas existe esperança para ir para além do mal que aconteceu e prevalecer. Quero acreditar que esta é uma das mensagens desta obra que nos mostra um lado menos agradável do ser humano.


segunda-feira, 5 de março de 2018

Opinião: Boneca de Trapos

Título Original: Ragdoll (2017)
Autor: Daniel Cole
Tradução: José Remelhe
ISBN: 9789896652920
Editora: Suma de Letras (2018)

Sinopse:

William Fawkes, um controverso detetive conhecido por «Wolf», acabou de ser reintegrado no seu posto após ter sido suspenso por agressão a um suspeito. Ainda sob avaliação psicológica, Fawkes regressa ao ativo, ansioso por um caso importante. se encontra com a sua antiga colega e amiga, a inspetora Emily Baxter, num local de crime, tem a certeza de que é aquele o grande caso: o corpo que encontram é formado pelos membros de seis vítimas, suturados de modo a formar uma marioneta, que ficou conhecida como «Boneca de Trapos». Fawkes é incumbido de identificar as seis vítimas, mas tudo se complica quando a sua ex-mulher, que é repórter, recebe uma carta anónima com fotografias do local do crime, acompanhada de uma lista na qual constam os nomes de seis pessoas e as datas em que o homicida tenciona assassiná-las. O último nome da lista é o de Fawkes. A sentença de morte com data marcada desperta as memórias mais sombrias de Wolf. O detetive teme que os assassinatos tenham mais a ver com ele — e com o seu passado — do que qualquer um possa imaginar.

Opinião:

Crimes horríveis, um assassino que é um mistério, um detective atormentado pelo passado e um grupo de inspectores que tentam dar o melhor no seu trabalho enquanto cada um lida com os seus próprios demónios pessoais. O resultado desta junção? Boneca de Trapos, um thriller que cativa, choca e nos impele para uma aventura impressionante. É que neste livro não queremos apenas apanhar o criminoso e descobrir o que o motivou. Desejamos também descortinar as personagens que trabalham para o lado da Lei.

O prólogo deste livro leva-nos para uma situação que, numa primeira análise, parece não ter qualquer ligação com os crimes principais deste livro. Nestas primeiras páginas conhecemos William Fawkes, também conhecido por Wolf, o detective protagonista desta obra. A situação em que ele se encontra deixa-nos perceber que está no limite do desespero. Como tal, anos após estes eventos, é com alguma relutância que alguns dos seus colegas o aceitam numa nova e macabra investigação.

Wolf é uma personagem que vai sendo desconstruída ao longo das páginas deste livro. Ao início, temos a ideia de um homem dedicado à profissão, que perdeu tudo devido à obsessão por um caso e que agora quer provar que ainda tem muito para dar. Mas Wolf é muito mais do que isso. Este protagonista pouco convencional pode não criar empatia imediata, mas apela à nossa curiosidade e surpreende à medida que se vai revelando. O homem forte dá lugar a uma figura destruída e que procura salvação. Os métodos que encontra para alcançar os seus desejos criam dúvidas e fazem-nos pensar sobre até onde podemos transpor limites sem condenarmos o que temos de bom.

Se é verdade que Wolf é uma personagem forte, o mesmo podemos dizer das figuras secundárias. Destaco  Baxter, que sugere ser uma simples colega de Wolf para se revelar uma figura que usa a máscara de mulher forte para ocultar as suas inseguranças e fraquezas. Edmunds, o novato menosprezado que pretende provar o seu valor, ainda que isso coloque em causa a vida familiar. Finlay, o mentor que parece ser um pilar fundamental de todo o grupo e traz algumas lufadas de ar fresco nos momentos mais pesados. Andrea, a ex-mulher que também é uma jornalista ambiciosa e disposta a tudo para conquistar o lugar que acredita merecer. Todas estas personagens não são básicas e conseguem impressionar, mesmo que não concordemos com os seus métodos ou motivações.

A sensação de perigo é constante. Ao mesmo tempo que queremos perceber a morte de seis pessoas inicialmente anónimas, estamos sempre na expectativa de descobrir o que liga cada uma daquelas figuras e que é o seu assassino. E como se tal não bastasse, surge ainda uma lista de futuras vítimas, com a data de morte de cada uma. Como tal, a tensão aumenta de página para página, ao mesmo tempo que mais mortes acontecem, de forma completamente incompreensível e sem que as forças policiais consigam fazer nada para contornar esta situação. Tudo isto faz o suspense aumentar e leva o nosso protagonista a voltar a entrar numa espiral de aflição. E é este desespero que faz com que cada uma das personagens revele o tem de pior.

O encadeamento dos acontecimentos faz com que o interesse na leitura não se perca, ainda que o ritmo, muitas vezes, seja mais lento do que o desejado. Este é um livro com muitas personagens, logo existem diversas figuras a conhecer bem, de modo a ser possível entender a narrativa por completo. O estilo de escrita de Daniel Cole não é elaborado, o que ajuda a entrar facilmente na história. O ambiente parece sempre negro, e as revelações que são feitas estão bem conseguidas.

Boneca de Trapos revelou-se uma figura que marca. Com um vilão inesperado e repleto de requintes de malvadez, Daniel Cole leva-nos a questionar a natureza humana e o que leva alguém a pensar que é superior a isso. As personagens fortes desta obra dão força a um enredo que só por si é apelativo, tornando este livro num thriller a ter em conta. Apesar de se tratar do primeiro volume de uma saga, Boneca de Trapos pode ser lido como stand alone. Mas acredito mesmo que depois de o lerem vão querer mais... Fica o aviso.

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

Opinião: Amor em 59 poemas

ISBN: 9789896655266
Editora: Suma de Letras (2018)

Sinopse:

Os melhores poemas de amor, reunidos num único livro. Descubra o sentimento que faz girar o mundo, eternizado pelas palavras de poetas de diferentes tempos e lugares.

Opinião:

Confesso não ser a maior fã de poesia, mas quando este livrinho surgiu nas minhas mãos senti que o devia ler. Esta publicação, criada a pensar nos mais romântico, consegue cativar logo pelo design. Ao longo das páginas, nota-se um grande cuidado na apresentação dos textos, o que rapidamente nos impele a ler um poema... e depois outro... e mais outro. Quando dei por mim, estava já avançada na leitura, mesmo não sendo normal sentir-me pressa por este tipo de texto.

Estão aqui presentes diversos poemas, de diferentes autores e épocas distintas. Existem escolhas feitas entre nomes nacionais, mas também entre escritores de outras nacionalidades, o que nos permite ter uma visão mais alargada sobre como este sentimento é vivido e experienciado em diferentes culturas, fases da vida, circunstâncias. Gostei que esta colectânea não se focasse apenas na alegria relacionada ao romance, havendo também poemas que falam de dor, desilusão, abnegação, descrença e esperança, por exemplo. Sendo assim, senti que as diferentes facetas deste sentimento foram abordadas, o que enriquece o conjunto final.

Como é natural, houve poemas de que gostei mais do que outros. Afinal, os 59 textos escolhidos são bem distintos, havendo uns que mexem mais comigo do que outros. Contudo, curiosamente, foram poucos aqueles que não cativaram o meu interesse. Gostei de reler alguns poemas, mas ainda mais de conhecer novos textos. Houve alguns poemas que me deixaram bem impressionada, ao ponto de os reler assim que os tinha terminado, de forma a saborear as ideias que eram transmitidas.

Esta publicação acontece poucas semanas antes daquele que é considerado o dia mais romântico do ano, 14 de Fevereiro, o Dia dos Namorados, mas penso que se trata de um livro que vai além desta data. Esta é uma obra amorosa que se pode guardar e reler e uma boa forma de declarar os nossos sentimentos por alguém que nos é especial. Afinal, é delicioso perceber que, nas últimas páginas, existem linhas vazias para que os mais ousados deem largar à veia artística e deixem a sua impressão sobre este sentimento. Não sei se serei capaz de o fazer, mas certo é que vou guardar este livrinho amoroso que me fez voltar a ler poesia.