terça-feira, 30 de julho de 2019

Opinião: Annabelle

Título Original: Annabelle (2017)
Autor: Lina Bengtsdotter
ISBN:  9789897772221
Editora: Planeta (2019)

Sinopse:

Onde foi infeliz, não devia voltar.

Charlie Lager é detective em Estocolmo quando chega um pedido de ajuda para investigar uma adolescente desaparecida em Gullspång. o problema é que ela é dessa localidade, de onde saiu aos catorze anos e não quer regressar.

À medida que tenta descobrir quem era Annabelle e o que lhe aconteceu, acabará por fazer descobertas surpreendentes sobre o seu passado...

Opinião:

A sinopse de Annabelle chamou-me a atenção. Numa época em que os thrillers fazem tanto sucesso na literatura, achei que este livro poderia ser refrescante dentro do género. A ideia de um desaparecimento numa localidade de onde a detetive é natural e de onde fugiu intrigou-me. É que logo à partida existiam dois mistérios: o que aconteceu a Annabelle e o que aconteceu à agente Charlie Lager durante a infância e juventude para ter ficado tão perturbada.

Este livro de Lina Bengtsdotter é o primeiro de uma série que terá Charlie como protagonista. Apesar de serem prometidos mais volumes, aviso desde já que esta história pode ser lida sem que seja necessário esperar pelo próximo livro. O mistério de Annabelle e a verdade sobre o passado de Charlie são factos que nos são apresentados durante estas páginas.

Começamos por conhecer a protagonista desta obra e a relação que tem com o seu colega de trabalho. Percebemos que se trata de uma mulher emocionalmente instável, que vive para o trabalho. O facto de ser uma mulher numa área onde existem mais homens faz-nos perceber que Charlie luta para se destacar pelos valores profissionais que tem. Dentro deste assunto, é curioso ver como a autora conseguiu, de forma subtil, mostrar como a presença de uma mulher neste meio pode afetar colegas e até respetivas companheiras. Isto é visto pela ligação de Charlie a Hugo e pela forma como o parceiro dela, Anders Bratt, se relaciona com ela de modo a evitar os ciúmes da própria mulher.

Charlie poderá não ser a amiga que queremos ter, mas é uma figura muito curiosa de desvendar. A forma como se entrega ao caso faz-nos ficar ainda mais interessados, ainda que muitas vezes nos vejamos a condená-la por algumas atitudes. O facto de Charlie ter um passado em Gullspång leva-a a criar empatia com a desaparecida Annabelle, mas também com outros jovens. Ainda assim, gostaria que a protagonista fizesse sentir maior empatia.

É através de Charlie que percebemos as carências, isolamento e pobreza desta localidade. Ela vê para lá das aparências, porque conhece o lado mais obscuro daquela população. Através disto, a autora faz-nos refletir sobre discrepâncias sociais entre as grandes cidades e as zonas mais remotas. este facto faz com que este livro se torna mais do que um thriller, mas como uma chamada de atenção social conseguida através de uma análise pertinente. Neste caso estamos a falar da Suécia, mas facilmente identificamos o nosso país nesta situação.

Os desenvolvimentos da investigação sobre o desaparecimento de Annabelle fazem-nos entender melhor esta localidade. Acabamos por ganhar carinho por esta jovem promissora que é limitada pela família e pelo local onde vive. Os segredos de Annabelle conferem profundidade a esta figura misteriosa que acaba por se revelar na totalidade. Faz-nos pensar que existem pessoas que são realmente vítimas de circunstâncias que não podem controlar. Ainda assim, gostariamos de a ver a lutar mais por ser melhor e por fugir da decadência a que parece se socorrer.

Lina Bengtsdotter apresenta esta história através de quatro pontos de vista que vão alternando. Ao início, alguns destes focos parecem bem distantes da história principal, mas com o desenrolar da narrativa tudo se vai ligando. Ao início poderá existir alguma dificuldade em entender o motivo de um ponto de vista em concreto, que parece não ter qualquer relevância para a história principal. Contudo, mais para o fim do livro, tudo faz sentido.

 Annabelle tem um desfecho imprevisível. Confesso que gostaria de algo um pouco diferente, mas percebo que esta escolha vem dar força a uma mensagem que a autora quis passar ao longo de toda a obra. Lina Bengtsdotter revela-se uma escritora talentosa, capaz de falar de personagens humanas e de construir histórias fortes e com enredos cativantes.


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