sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Opinião: A História de Uma Serva

Título Original: The Handmaid's Tale (1985)
Autor: Margaret Atwood
Tradução: Rosa Amorim
ISBN: 97897225257707
Editora: Bertrand Editora (2013)

Sinopse:

Extremistas cristãos de direita derrubaram o governo norte-americano e queimaram a Constituição. A América é agora Gilead, um estado policial fundamentalista onde as mulheres férteis, conhecidas como Servas, são obrigadas a conceber filhos para a elite estéril. Offred é uma Serva na república de Gilead e acaba de ser transferida para casa do enigmático Comandante e da sua ciumenta mulher. Pode ir uma vez por dia aos mercados, cujas tabuletas agora são imagens, porque as mulheres estão proibidas de ler. Tem de rezar para que o Comandante a engravide, já que, numa época de grande decréscimo do número de nascimentos, o valor de Defred reside na sua fertilidade e o fracasso significa exílio nas Colónias, perigosamente poluídas. Defred lembra-se de um tempo, antes de perder tudo, incluindo o nome, em que vivia com o marido e a filha e tinha um emprego. Essas memórias vão-se agora misturando com ideias perigosas de rebelião e amor.

Opinião:

A Bertrand Editora decidiu relançar em Portugal umas das distopias mais aclamadas. De autoria de Margaret Atwood, A História de Uma Serva apresenta uma narrativa chocante sobre um futuro teocrático e onde o papel da mulher tem um retrocesso impressionante.

O início da leitura pode ser um pouco desencorajador. Não são dadas grandes informações sobre o tempo e o local onde a acção se desenrola, o que pode causar uma ligeira confusão. Neste aspecto, a sinopse acaba por ser mais reveladora e ajudar. O leitor percebe que está a entrar numa sociedade onde as mulheres têm funções bastante limitadas, onde a liberdade é uma vaga lembrança e a principal esperança de todos está na fertilidade.

Defred é a protagonista desta trama. Através dos pensamentos desta mulher é possível perceber a organização da sociedade que integra, os mais poderosos são donos e senhores das grandes decisões governativas e até mesmo da vida privada dos habitantes daquele local. Este é um local altamente repressivo, governado pelo medo, e isso é evidente não só nos desejos reprimidos da protagonista como também nos silêncios tão significativos desta mulher e das personagens que a rodeiam. E é este silêncio que acaba por tornar esta obra tão forte.

Desde cedo percebemos que Defred sofre. É uma mulher solitária, que recorda com dor um passado mais feliz, que vive angustiada por não saber o paradeiro daqueles que ama em segredo, que tem consciência que passou por um processo de lavagem cerebral e, mesmo assim, que deseja ter sucesso na missão que lhe foi imposta.

Defred incomoda o leitor. Não só pelo seu sofrimento, mas por ser uma mulher que parece resignada à vontade dos outros. Os sentimentos que surgem durante a leitura são contraditórios, tanto é possível desejar uma forma de libertação milagrosa desta protagonista como sentir alguma revolta pela sua submissão. Com o passar das páginas começasse a chegar a um consenso, pois não só surge mais informação como também se inicia um processo gradual de transformação. É curioso ver que durante apenas é dado a conhecer o nome que foi dado à protagonista pela sociedade, sendo a sua verdadeira nomenclatura ocultada, uma associação à perda de direitos sobre a própria vida.

Distopia que marca o leitor, A História de Uma Serva faz reflectir sobre as consequências do avanço da ciência para a humanidade e em como o desenvolvimento pode provocar uma regressão social. Mais uma vez, o mito de eterno retorno em acção. As referências aos campos onde são colocados os elementos revoltosos são interessantes, que apenas pecam por serem escassas. Teria sido interessante ter uma visão mais abrangente sobre este mundo, mas percebesse a razão de assim não ser, afinal a falta de informação é simbólica da vida de Defred.

A mulher, figura tão reprimida nesta obra, é também o género central. Afinal, é nela que está a capacidade de carregar uma nova vida. É curioso ver a forma como a autora dividiu a figura feminina em três diferentes facetas principais: esposa, procriadora e dona de um lar. Sendo assim, as mulheres passam a ficar encarregas apenas de uma destas funções, o que faz com que existe entre todas um sentimento de vazio. Também nos homens existe uma repartição de tarefas, mas esta não é tão perceptível.

O final fica em aberto, e o leitor apenas pode conjecturar sobre o que realmente aconteceu. Fica, no entanto, a ideia de que este é um livro diferente e de muito valor. Uma leitura forte e que vai agradar as mentes mais exigentes. Recomendo.

2 comentários:

Jacqueline' disse...

De facto, é fantástico quando nos deparamos com livros de qualidade que nos obrigam a uma leitura ativa, na medida em que reflectimos sobre os mesmos :) Estou com vontade de ler este !

Cláudia disse...

Espero que gostes*